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Sob os escombros: as consequências ambientais causadas pelas demolições no Parque União

Atualizado: 30 de set.






Por Edith Medeiros e Kaya Mendes

Há pouco menos de um mês, o conjunto de favelas da Maré, no Rio de Janeiro, foi palco de demolições realizadas pela Prefeitura e acompanhadas pela Polícia Militar. No entanto, o processo, marcado pela ausência de planejamento e suporte, deixou para trás uma comunidade em crise, enfrentando graves impactos ambientais e sociais. A situação expõe de forma nítida as desigualdades no tratamento de diferentes áreas da cidade e lança luz sobre um tema recorrente: o racismo ambiental.


É necessário entender que as decisões feitas são escolhas políticas, tanto no momento em que prefere não ver o que está sendo construído, sendo conivente na medida em que não corta pela raiz o problema; quanto no imediatismo de resolução a partir de quando o problema é de fato “visto”, encarado como uma questão que precisa ser resolvida. Será que a pressa seria a mesma em todos lugares do Rio de Janeiro? A zona sul receberia o mesmo tratamento que a Maré? 


Com base nessa dúvida e numa tentativa de responder uma pergunta que de alguma forma já se tem a resposta, a Inteligência Artificial foi utilizada como recurso simulatório de possibilidades - como seria a desapropriação de um terreno irregular na zona sul do Rio, entendendo todo o contexto da valorização daquele território e seus moradores.




O chat GPT analisou as condições socioeconômicas da Maré e sugeriu os passos que seriam dados pela prefeitura, como a ordem de desapropriação, citando as possíveis ações que envolveriam o processo - falta de diálogo entre prefeitura e moradores, as condições e prazos curtos para desocupação, a falta de compensação justa nesse processo, não havendo indenização adequada, além do despejo forçado, acompanhado frequentemente de força policial. 

 

Nas ações simuladas no que seria uma desapropriação feita pela prefeitura em um terreno na zona sul, haveriam passos como a negociação - antes de qualquer ação de despejo seria necessário negociar com os proprietários, oferecendo prazos para regularização fiscal e possíveis soluções alternativas à demolição. Também haveria mínima intervenção: mesmo após a ordem de demolição, a prefeitura ofereceria a possibilidade de os proprietários realizarem as adequações necessárias para evitar a perda do imóvel. E, sendo inevitável, haveria a desapropriação, com a compensação calculada com base no valor de mercado do terreno, garantindo uma indenização substancial aos proprietários. Além disso, os proprietários receberiam apoio jurídico durante todo o processo para garantir que seus direitos fossem respeitados.


A IA finaliza com a conclusão comparativa, que expõe as diferenças no tratamento de terrenos na Zona Sul e na Maré, evidenciando o racismo ambiental. “Enquanto na Zona Sul há negociações, compensações justas e preservação da dignidade dos proprietários, na Maré as desapropriações são feitas de forma arbitrária, sem diálogo ou apoio adequado, resultando em danos irreparáveis para as comunidades envolvidas.”


A ação, conduzida sem o devido planejamento e respeito às diretrizes legais, expôs famílias a graves riscos de saúde e violações dos direitos fundamentais. A remoção abrupta, sem aviso prévio e sem suporte adequado das autoridades, levantou questionamentos sobre a maneira como o poder público vem lidando com os nossos territórios . 


Andréia Coutinho Louback, ativista climática e cofundadora do Centro Brasileiro de Justiça Climática, em seu livro “Quem Merece Justiça Climática no Brasil”, aborda as desigualdades sociais que emergem da crise climática. “Os impactos da crise do clima, ou seja, da mudança do clima, da emergência climática que vivemos, não são democráticas, não são proporcionais. Existe um desbalanço muito forte entre quem emite e quem sofre, essas pessoas têm nomes: pessoas negras, faveladas e pobres, afirma Louback. A realidade do Parque União parece ecoar exatamente essas palavras.


Segundo o jornal comunitário Maré de Notícias, moradores da região foram forçados a deixar suas casas devido à poeira e aos escombros resultantes das demolições.  "Não recebemos nenhum aviso. Quando percebemos, as máquinas já estavam destruindo tudo", relata Andreza Santana, moradora há mais de 20 anos do Parque União. 



A poeira levantada pelas obras sem planejamento adequado tem causado problemas respiratórios em crianças e idosos, além de contribuir para um ambiente insalubre.  "Meu filho de três meses  está com bronquiolite desde que começaram as demolições", desabafa outra moradora, que preferiu não se identificar.


Além dos problemas de saúde, a rotina escolar também foi gravemente afetada. A Escola Professor Cesar Pernetta, localizada na área impactada, tem enfrentado dificuldades para manter as aulas em funcionamento, especialmente nos turnos noturno e no supletivo, que dependem da presença física dos estudantes.  "Os alunos não conseguem se concentrar com a poeira e o barulho. Isso sem contar os que nem conseguem chegar à escola por causa das incursões policiais", explica uma dos professores da rede de ensino. Segundo o Centros Integrados de Educação Pública (CIEP), a escola oferece ensino médio regular e supletivo, sendo um dos principais polos educacionais da região, o que agrava ainda mais o impacto das demolições sobre a comunidade.


Demolições na Maré: Consequências Ambientais e o Papel Político em Ano Eleitoral


Outro aspecto alarmante são as consequências ambientais deixadas pelas demolições. Moradores relatam que os escombros abandonados na Rua Ary Leão têm servido de criadouro para pragas como ratos e são um terreno fértil para a proliferação de doenças como a dengue. Com o verão chegando e a possibilidade de chuvas fortes, a população teme um possível  surto de dengue e outras doenças.


De acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde, a região da Maré tem registrado um aumento significativo nos casos de dengue, um problema que pode ser agravado pela falta de saneamento básico adequado. Além disso, a presença de entulho, como o que se acumula nas proximidades da Escola César Pernetta, está gerando sérios impactos ambientais e de saúde pública. Esse acúmulo de resíduos impede o escoamento adequado das águas pluviais, aumentando o risco de enchentes e alagamentos. O cenário é agravado pelo histórico da área, que anteriormente era uma região alagadiça e passou por um processo de aterramento, levando à destruição da franja de manguezal original, o que intensificou a vulnerabilidade do território a inundações.


A situação no conjunto de favelas da Maré vai além de um simples problema de urbanização; ela revela as profundas desigualdades estruturais. Em um ano de eleições para Prefeito e Vereadores, é essencial refletir sobre o impacto dessas ações políticas. A democracia deve ser utilizada para garantir nossos direitos e deveres. O Vereador, por exemplo, tem o papel de representar os moradores na distribuição de recursos para as demandas sociais do território, enquanto o Prefeito é responsável por discutir, questionar e decidir sobre essas necessidades. Tomar medidas drásticas sem considerar os impactos no cotidiano dos mais de 100 mil mareenses é desrespeitar a voz da comunidade que ali vive e luta.


Acompanhe algumas imagens do local :



Morador tentando desobstruir a passagem próximo a Rua Ari Leão, onde a Prefeitura do Rio demoliu dezenas de residências .

Foto: Ardo Foxx


Danos causados pelos operadores da Prefeitura, na ação de demolição nas casas do Parque União, imagens de dentro da residência .


Ryan, morador da comunidade desde a infância, relata que as incursões policiais foram totalmente arbitrárias. Alguns residentes resistiram à ação coordenada da polícia e dos agentes da prefeitura, tendo suas casas poupadas pelo fato de estarem presentes no momento do despejo. Agora, além de lidar com os danos físicos às residências, os moradores precisam enfrentar problemas de saúde, pois os escombros das demolições acumulam lixo doméstico e ocasionam a proliferação de doenças e pragas, como ratos e mosquitos.





Créditos fotográficos : Ardo Foox

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